domingo, 22 de agosto de 2010

Profissão Viver

Hoje parei para pensar que profissão é a minha. Acho que foi uma pergunta muito próxima da “o que você quer ser quando crescer” que me faziam antes. Eu já tive tantas certezas sobre isso... Já quis tanto ser uma coisa e não outra que até assustava quando me descobria mudando de gosto. Daí que hoje eu me olhei e vi como eu não combino com o perfil do profissional da minha área. Nunca me preocupei com luta de classe, salário, organização rigorosa (quase inflexível!) nas ações, caramba!, eu não combino comigo... com esse meu lado que é pago para isto e não aquilo. Então suspirei e descobri que minha profissão é viver! Sei que profissão deve ser substantivo e não verbo. Mas a minha profissão é VIVER, mesmo! Verbo intransitivo, mas que pede todos os adoráveis complementos que implicam nesta ação. Ah! Profissão viver é parar ao som de uma buzina e comer um cuscuz que você não faz idéia de onde veio, como se fosse um manjar dos deuses. É sair pra rua no estreito espaço entre uma aula e outra só para olhar pardais. É esconder um livro na gaveta do escritório pra saborear, entre um balanço fiscal e outro, e não sufocar de tanta realidade. Profissão viver é contar uma história, mesmo quando ela nos consome, com o maior prazer, e se descobrir, e se pensar com ela... É ligar pra uma amiga na Indonésia e falar do cheiro do café brasileiro, sem se dar conta da conta telefônica! E ligar de novo no caso da ligação cair antes de dizer “um beijo”. É suspirar às dez da noite, após ter trabalhado dia inteiro, só porque o filho sorriu quando viu você chegar. Profissão viver é amar mesmo sabendo que vai doer... É ler quatro vezes o mesmo livro e ainda descobrir um quê de poesia que você ainda não tinha visto. É ouvir bossa nova e sentir-se a beira mar se um vento lhe toca as costas mesmo estando a quilômetros e quilômetros dele. É fazer versos dos amigos, e não pra eles. Compreendendo assim o velho poeta de Alegrette. É percorrer os quintais de Quintana, autopsicografar-se como Fernando, se colorir de Coralina prosa. É saber que a vida é isto ou aquilo ou nenhuma das respostas anteriores, com licença de Cecília! Minha profissão é viver. Vir e ver todo dia os mesmos lugares com perspectivas novas (e brigar sozinha por isto, se for preciso!). É ver estrelas na noite nublada só porque lembrou daquele olhar, daquela voz, daquele serzinho que lhe faz sentir tão capaz de amar, sonhar, escrever! VIVER. Minha profissão é viver. E vivo. Talvez você diga: “Diz isso porque está empregada e tem profissão”. Mas eu conheço tanto José da Silva desempregado, doente e feliz. Verdade! São meus colegas de profissão. Mas não vou discutir com você não. É, prefiro calar. Mesmo. Hoje em dia, penso que existem coisas que não são para serem entendidas e sim sentidas. E de mais a mais, não ter resposta também faz parte da minha profissão.
Do livro meu livro "Cenas Comuns"
Pra você, Beth, que viveu com plenitude e deixou seu rosto, ações e afeto gravados carinhosamente dentro de nós!

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