segunda-feira, 7 de junho de 2010

Capítulo 4: Mas onde estavam os livros?

Xiiiiiii. Mas onde estavam os livros na minha vida?! Eles sempre estiveram por perto. Sempre. Minha casa tinha uma estante cheia. Havia o exemplo do meu pai, mas não fui leitora assim de cara, como algumas pessoas, não. Eu até que mexia neles, mas... Certa vez, aos quatro anos peguei um livro pra "ler" pro meu irmão recém nascido, só porque a capa era azul, linda! A família virou platéia, foi divertido. Comecei a ler, oficialmente aos seis anos, com a professora Letícia, nome cujo significado é aquela que traz a luz, e ela fez mesmo isso, com tal carinho que não tive dificuldades para decodificar. Mas demorei a me tornar leitora. Conto isso também no meu "Cenas Comuns". Lembro-me de que aos dez anos li dois livros que a escola mandou. Mas o que às vezes ainda me faz corar é a lembrança de um dia, na segunda série, quando eu tinha oito anos. Meus pais tinham me dado um livrão do Tom e Jerry. Era mais um gibizão que livro propriamente. Não importa. Eu queria mostrar a professora. Quis tanto, insisti tanto, que ela gritou pra eu sentar. Ao final da aula, quando a maioria já tinha ido embora, chamou-me dizendo: "Vai, Hellenice, me mostra o livro agora". Eu mostrei, né... Escrevo isso, não para culpar A ou B, mas principalmente para que professores, como eu, que atuem com criança, jovem, adulto ou velho fiquem mais atento. Enfim. Eu brincava de "quem lê melhor", com um tio e uma irmã, mas não encarava livro sozinha. Ganhava gibi alguns domingos. Lembro-me até do jornaleiro, um senhor moreno e sorridente que passava em nossa casa toda manhã pra vender os jornais e, às vezes, como disse, gibis. Lia as lições dos livros didáticos. E pintava as ilustrações - que ram sempre em preto e branco. Aliás, essa era a parte que eu mais gostava! (Um dia a arte e os livros me chamariam pra uma conversa de gente grande...) Pouco antes de falecer, meu pai me deu O Pequeno Príncipe. Eu não li. Aos doze ganhei uma afilhada.Era muito frágil. Ficou muito doente. Então, eu, que era católica, prometi que se ela vivesse, eu leria um livro da minha mãe, sobre a vida de Jesus. Era um dos maiores da casa. Márcia sobreviveu. E eu, me tornei leitora. Ela me batizou. Salvamo-nos! Depois da promessa paga, a duras penas, verdade, passei pro Pequeno Príncipe. Dele pras Júlias e Sabrinas, todos os de José de Alencar da estante, um tiquinho disso, outro daquilo. E por aí foi. Na sétima e oitava séries do ensino fundamental tive um excelente professor de Língua Portuguesa, o Almeida, do Instituto Nossa Senhora da Glória, o nosso Glorinha. Com ele conheci muita gente boa da Literatura. Tive contato com obras que visito e indico até hoje. "A morte tem sete herdeiros", por exemplo, mostrei recentemente pra minha filha e ela gostou tanto que passou pra duas primas. "Caminhando na chuva", do Charles Kiefer, deixou tão boas recordações que fiz questão de cumprimentar o autor, pra agradecer, na Feira do Livro de Porto Alegre, em 2008, onde ele fora homenageado. "Encontro marcado", do Fernando Sabino, foi motivo para que eu reproduzisse a história-título com mais duas amigas, no Ensino Médio (só que nós cumprimos!). E o apaixonante "Noite de almirante", do Machado, ficou tão dentro de mim que saiu e virou texto meu. Vou postar aqui também. Fera nas escolhas, o Almeida! Bons livros. Boas lembranças. Bom profissional! Isso é sempre um diferencial na vida da gente. Eu tive e tenho sorte. Aos dezessete fiz minha opção religiosa e li muuuuuuuuuito, muito mesmo. Tornei-me uma devoradora de obras dos mais variados estilos literários. Primeiros relacionados à minha religião. Depois, com o tempo, um pouco de tudo. Veio a faculdade, onde a indisciplina de só ler o que me dava prazer atrapalhou um pouco. Fui me disciplinando (bem pouco, verdade); veio o trabalho como contadora de histórias e com ele tanta gente boa que nem ousaria nomear, para não correr o risco de esquecer alguém. Veio a Arteterapia com outros tantos livros, sendo o mais forte deles, de cabeceira até hoje, o "Mulheres que correm com os lobos", da Clarice Pinkóla. Veio a terapia, onde fui recebida com texto de Clarice Lispector e presenteada com uma obra dela quando obtive "alta". Um tempo antes, em agosto 2001, veio a mágica presença de Lygia Bojunga! O primeiro livro dela que li foi "A bolsa amarela", eu contava 31 anos. Leitora tardia de Lygia, sou absolutamente encantada por sua criação. Os mais especiais pra mim são "Corda Bamba" e "Retratos de Carolina", me acho uma mistura de "Maria" e "Carolina" (lendo os dois entenderão um pouco). Antes de completar um ano, em junho de 2002, já tinha lido 16 das 18 obras publicadas por ela, até então. E em abril deste mesmo ano, dois meses antes então, eu iniciara o Programa de Incentivo à Leitura "Livro, Arte e Cia", que procuro conduzir até hoje. Semeando aqui e ali, nesta cidade em que vivo, pequenos grãozinhos, na esperança de ajudar novos leitores, novos apaixonados pela Literatura. Cinco anos depois nasceram, através deste Programa meus dois filhos de papel: "Cenas Comuns" e "Poemar". Meus jeitos de dizer crônicas e poesias. Meus pensares encardenados. Bem, se alguém hoje me perguntasse onde estão os livros em minha vida, eu responderia com outra pergunta: "-Onde está minha vida, sem os livros?"

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